Em um gesto diplomático com implicações agrícolas e geopolíticas significativas, o governo do México anunciou o envio emergencial de água ao estado do Texas, nos Estados Unidos. A medida visa cumprir parte das obrigações do Tratado de Águas de 1944, que regula o compartilhamento de águas entre os rios Bravo (Grande) e Colorado pelas duas nações.
A decisão ocorre após semanas de pressão do governo texano e da Comissão Internacional de Limites e Águas (CILA), que alertaram sobre o impacto da escassez hídrica nas plantações do Vale do Rio Grande, uma das regiões agrícolas mais produtivas dos EUA.
“Essa decisão mostra o compromisso do México com a cooperação bilateral e com a segurança alimentar da região fronteiriça”, afirmou em nota o chanceler mexicano Alicia Bárcena.
Segundo a CILA, o volume enviado nesta etapa equivale a 30% da cota anual que o México deve repassar aos EUA, conforme estipulado pelo tratado. O restante será programado conforme a disponibilidade dos reservatórios e o monitoramento de chuvas nas bacias hidrográficas mexicanas.
Contexto histórico: um acordo que evita conflitos há 80 anos
Firmado há quase oito décadas, o Tratado de Águas de 1944 tem sido uma das peças-chave na estabilidade das relações entre México e Estados Unidos, garantindo previsibilidade no uso de recursos hídricos compartilhados e evitando disputas territoriais mais graves. No entanto, em anos de seca — como os registrados em 2023 e 2024 —, a tensão entre os dois países tende a aumentar, com repercussões políticas e econômicas imediatas.
Impactos para os agricultores, acordos diplomáticos e previsões para os próximos meses
O envio emergencial de água do México ao Texas chega em um momento crítico. Agricultores do sul texano, especialmente os produtores de cana-de-açúcar, milho, cítricos e algodão, enfrentavam prejuízos crescentes devido à escassez hídrica que já durava mais de dois meses. A irrigação de emergência anunciada pode reduzir perdas e evitar colapsos em cadeias produtivas regionais.
De acordo com a Texas Farm Bureau, cerca de 40% das plantações na bacia do Rio Grande estavam sob risco de colheita abaixo da média. Com a liberação dos volumes, estima-se que ao menos 150 mil hectares possam ser parcialmente recuperados, evitando uma crise mais profunda nos mercados locais.
Repercussão diplomática e postura dos governos
A decisão foi bem recebida por autoridades norte-americanas. Em comunicado conjunto, o Departamento de Estado dos EUA e a International Boundary and Water Commission (IBWC) destacaram a importância da “resposta ágil e cooperativa do México”, e reafirmaram a confiança mútua na execução do tratado.
“É um exemplo de como a diplomacia e o diálogo técnico podem prevenir conflitos em cenários de escassez”, disse Maria-Elena Giner, comissária americana da IBWC.
Por outro lado, setores políticos mexicanos mais nacionalistas criticaram a liberação emergencial, apontando que a priorização da demanda externa pode comprometer o abastecimento de comunidades mexicanas do norte, também afetadas pela seca.
Previsões e desafios para os próximos meses
Meteorologistas do Servicio Meteorológico Nacional (México) apontam que a previsão para os meses de maio e junho ainda é de chuvas abaixo da média histórica nas bacias do Rio Conchos e do Rio San Juan — principais afluentes do Rio Grande.
Com isso, especialistas alertam que o cumprimento integral da cota hídrica de 2025 dependerá de acordos técnicos mais flexíveis e de novas negociações sobre o ritmo de entrega dos volumes remanescentes. Espera-se que um novo encontro bilateral ocorra em julho, para revisar os termos do acordo e discutir compensações mútuas.
Conclusão: água como ativo diplomático e desafio regional
A decisão do México de enviar água ao Texas, em meio a uma das piores secas das últimas décadas, evidencia como recursos hídricos se tornaram instrumentos de pressão geopolítica e econômica. O cumprimento parcial do Tratado de Águas de 1944, somado às ameaças de tarifas por parte do governo dos EUA, mostra que a diplomacia hídrica está no centro da agenda bilateral.
Para o México, o desafio é duplo: atender às obrigações internacionais sem comprometer o abastecimento interno, especialmente em estados como Chihuahua e Coahuila, onde os reservatórios estão em níveis historicamente baixos. Para os EUA, a pressão política interna, especialmente do Texas, exige respostas rápidas que nem sempre consideram as limitações climáticas do país vizinho.
Nos próximos meses, o sucesso das negociações dependerá da capacidade de ambos os países em equilibrar interesses agrícolas, ambientais e diplomáticos, com soluções técnicas que considerem a variabilidade climática e a sustentabilidade dos recursos hídricos compartilhados.
Perguntas Frequentes (FAQ)
1. O que é o Tratado de Águas de 1944?
É um acordo entre México e EUA que regula o uso das águas dos rios Bravo (Grande) e Colorado. O México deve entregar, em média, 350 mil acre-pés de água por ano aos EUA em ciclos de cinco anos.
2. Por que o México está atrasado nas entregas?
Devido a uma severa seca que afeta o norte do país, os níveis dos reservatórios estão baixos, dificultando o cumprimento das cotas estabelecidas no tratado.
3. Quais as consequências do não cumprimento?
O governo dos EUA, liderado por Donald Trump, ameaçou impor tarifas e sanções ao México caso as entregas de água não sejam regularizadas.
4. Como os agricultores do Texas são afetados?
A escassez de água impacta diretamente a irrigação de culturas no sul do Texas, levando a perdas agrícolas e econômicas significativas.
5. Há previsão de resolução para o impasse?
As negociações continuam, com o México propondo entregas parciais e buscando alternativas técnicas para cumprir o tratado sem comprometer o abastecimento interno.